Falamos hoje mais abertamente sobre ansiedade, depressão e outros transtornos, reconhecendo a importância de cuidar do nosso bem-estar, tanto emocional quanto físico. As empresas, as escolas, enfim, boa parte da sociedade acordou para esse problema, e falar sobre saúde mental se tornou uma pauta necessária. Não à toa que meu terceiro livro, “Admirável Mundo Louco”, lançado no final do ano passado, abordou esse tema.

Embora a conscientização tenha aumentado e os esforços para trazer o tema à luz sejam cada vez maiores, os números alarmantes indicam que precisamos ir além de falar sobre o tema, precisando de fato buscar soluções para o problema.

Nos últimos anos, a saúde mental no ambiente de trabalho se tornou uma preocupação crescente. Uma pesquisa da ComPsych revelou que as licenças relacionadas à saúde mental aumentaram 300%, entre 2017 e 2023, e que 69% foram solicitadas por mulheres.

Essa estatística é um reflexo de um problema maior que se estende além do ambiente de trabalho. As mulheres falam mais sobre suas dificuldades emocionais, procuram mais ajuda e admitem mais a necessidade de cuidados mentais. Porém, apesar dessa abertura, elas continuam a adoecer mais.

Então, por que isso acontece? Uma das razões é que as mulheres enfrentam uma série de desafios únicos que aumentam sua vulnerabilidade a problemas de saúde mental. O relatório “Mulheres no Local de Trabalho”, da McKinsey, em 2023, destacou que as mulheres sofrem microagressões a uma taxa significativamente maior do que os homens, o que contribui para o aumento do estresse e da ansiedade.

Além disso, as mulheres são frequentemente sobrecarregadas com responsabilidades tanto no trabalho quanto em casa, levando a um esgotamento maior.

Um problema que começa na infância

Estudos realizados nos Estados Unidos comprovam que as mulheres estão procurando em maior número os serviços de emergência e os cuidados de saúde primários com sintomas de automutilação, distúrbios alimentares e diversos tipos de ansiedade e depressão.

E um problema grave, que pode perpetuar essa diferença de números em relação ao gênero, é que essas jovens muitas vezes enfrentam uma abordagem nos cuidados de saúde mental que não distingue meninos e meninas, e que, por consequência, tira da equação elementos essenciais como os fatores biológicos, psicológicos e sociais que mantêm essas condições nas mulheres.

O trauma é um desses fatores frequentemente ignorados. Meninas que passam por traumas na infância, como abuso emocional, físico ou sexual, apresentam um risco significativamente maior de, no futuro, desenvolverem problemas de saúde mental.

A adolescência é um período crítico. Durante essa fase, as meninas estão moldando suas identidades, enfrentando expectativas sociais, acadêmicas e de imagem corporal.

As redes sociais, por exemplo, podem criar pressões e angústias adicionais, exacerbando a sensação de desconexão e irrealidade. A pandemia de COVID-19 apenas intensificou esses desafios, com muitas jovens experimentando um aumento na solidão e no isolamento, o que contribuiu para o crescimento de taxas de depressão e ansiedade.

Além dos fatores sociais e emocionais, os aspectos biológicos também desempenham um papel crucial. O ciclo menstrual e as flutuações hormonais podem impactar significativamente a saúde mental das mulheres. Meninas que passam pela puberdade precocemente correm maior risco de ansiedade e depressão, e condições como Transtorno Disfórico Pré-Menstrual (TDPM) são exemplos de problemas específicos das mulheres que, na maioria das vezes não recebem a atenção devida.

Portanto, para abordar efetivamente a saúde mental das mulheres, é necessário adotar uma abordagem holística que considere todos esses fatores.

Precisamos começar a cuidar dessa diferença de gênero desde que as mulheres são meninas. A prevenção e a intervenção precoce são essenciais. Programas educacionais que promovam a autoestima, o reconhecimento e a gestão de emoções como a raiva, e que ensinem habilidades de enfrentamento, podem fazer uma diferença significativa.

Criar um ambiente seguro e de apoio, tanto em casa quanto na escola, onde as meninas se sintam valorizadas e ouvidas, é fundamental.

Investir em uma nova abordagem centrada na mulher, que seja holística e empoderadora, é um passo importante para conter a onda crescente de doenças mentais entre as mulheres. A saúde mental é um direito de todos, e é hora de garantir que as necessidades específicas das mulheres sejam atendidas com a seriedade e o cuidado que merecem.

 

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.