Não é possível mensurar nem comparar a dor das pessoas, por gênero, em tragédia socioambiental como a do Rio Grande do Sul. O intenso voluntariado, que inclui homens e mulheres, de várias faixas etárias, gente comum e gente famosa, parece demonstrar que todos somos capazes da mesma comoção e disposição de auxílio mútuo.

Tanto a dor como a prontidão para ajudar não parece ser uma questão de gênero, mas de solidariedade humana, que muitas vezes pensamos estar perdida. Redescobrimos essa força em situações extremas.

A insegurança socioambiental, no entanto, maior questão do nosso tempo no mundo e no Brasil, tem sido subestimada de um modo geral, quer pelas cadeias de comando públicas e privadas, quer pelos cidadãos que veem perplexos tragédias como as que têm se sucedido cada vez com mais frequência, cada vez mais devastadoras, sem se dar conta de que há muito para fazer em mitigação e adaptação às mudanças climáticas para a prevenção aos desastres.

Não são fatalidades. Como os cientistas vêm alertando há décadas, são fenômenos produzidos pelos humanos, não por Deus nem pela Natureza. É preciso prevenir desastres anunciados, mapeados. É preciso que os governos assumam suas responsabilidades. Escutamos, escutamos, mas na hora de votar não temos considerado a questão ambiental nas nossas escolhas. E, nesse aspecto, é possível observar diferença no comportamento de gênero.

Os espaços decisórios nos governos, nos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, bem como nas três esferas (federal, estadual e municipal), ainda são majoritariamente ocupados por homens.

Embora tenhamos no Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas uma mulher internacionalmente reconhecida, Marina Silva, o Ministério, historicamente, tem um percentual pequeno do orçamento da União – este ano pouco menos de quatro bilhões.

Na Câmara dos Deputados apenas 17% das 513 cadeiras são ocupadas por mulheres. No orçamento de 2024, foram localizados somente quatro repasses de recursos, num total de R$ 2,5 milhões em emendas individuais, de bancada ou de comissões para a prevenção de desastres, defesa civil, ações de cunho ambiental ou de mitigação das mudanças climáticas. Isso com desastres acontecendo em vários estados do país e com todos os alertas para novos eventos.

O Rio Grande do Sul é representado no Congresso Nacional por três senadores, 24 deputados e sete deputadas. Essa bancada destinou quase R$ 1,6 bilhão em emendas individuais e de bancada para o estado em 2024, mas apenas três deputadas enviaram recursos para ações de cunho ambiental. Foram elas Fernanda Melchionna (PSOL-RS), com duas emendas, num total de R$ 1,7 milhão, para a elaboração de projetos de prevenção à erosão costeira e para gestão socioambiental e, para ações de educação ambiental, Maria do Rosário (PT-RS) destinou R$ 500 mil e Reginete Bispo (PT-RS) disponibilizou R$ 300 mil.

Esse fato pode ser considerado revelador de uma maior sensibilidade das mulheres para a situação socioambiental? Talvez apenas estejamos despertando primeiro. Afinal, temos um papel singular na preservação da vida.

Observo os temas que movimentam o interesse das mulheres em oportunidades de formação, informação e reflexão, onde atuo há anos. As formações, cursos abertos, palestras e debates sobre questões socioambientais atraem mais mulheres (na proporção de 70 a 80%). Os conselhos referentes a meio ambiente, desenvolvimento sustentável e conselhos comunitários em geral também têm maior participação feminina. Trabalhamos tanto como os homens e mais, mas achamos espaço para essas atividades. Será que isso tem contribuído?

Tomara que essa sensibilidade nos ajude a olhar com maior cuidado os postulantes a cargos públicos, as histórias e propostas das candidatas e candidatos, nas eleições que se aproximam.

 

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.