Carpintaria é a oficina onde trabalha o profissional que cria diversos trabalhos em madeira, muito úteis no nosso dia a dia e acessíveis logo ao primeiro olhar. Já no teatro, o termo subverte o sentido e sugere conhecer o interior, essência do ser humano, um campo profundo a ser desvendado. O nome se refere a uma técnica fundamental para a formação de talentos, inédita no Brasil, trazida pela atriz Joana Medeiros após longa experiência na França.

Filha única da também atriz Maria Lúcia Dahl, falecida em 2022, aos 80 anos, Joana, hoje com 53 anos, cresceu no universo da atuação e começou a carreira ainda criança. Ela se encantou pela técnica criada pelo teatrólogo mestre Luc Charpentier, com quem ela estudou durante quatro anos no país europeu, quando encontrou aquilo que, para ela, era o que faltava para uma boa formação de atores.

‘Carpintaria do Ator’ consiste em desenvolver no indivíduo a capacidade de percepção de sua própria personalidade, possibilitando-o reconhecer suas características e como elas se apresentam diante das situações e emoções do cotidiano.

Usada para cinema, audiovisual e desafios teatrais, a ‘Carpintaria’ é um conjunto de técnicas para o autoconhecimento da estrutura física e emocional, e que se torna o ponto de partida para construção do personagem e improviso, como Joana Medeiros explica.

“Ela parte do corpo físico, concreto, para a gente chegar no campo mental. A técnica estuda o corpo do ator no seu cotidiano e, também, na sua essência. A partir desse conhecimento é possível realizar o trabalho de construção e de investigação de um personagem”, pontua a atriz.

Em bate-papo para o IstoÉ Mulher, Joana destacou que a técnica é importante para permitir ao ator construir personagens diversos. Ela lembra que, embora reconhecidos em seus trabalhos, alguns atores acabam criando um estilo único para todas as atuações e interpretando o mesmo personagem, mesmo em papéis diferentes.

A atriz trabalhou durante oito anos na companhia do diretor e dramaturgo Zé Celso (1937 – 2023), no Teatro Oficina, em São Paulo, entre 2014 a 2012, e vai ministrar, no Rio de Janeiro, sua segunda oficina ‘Carpintaria do Ator’, que acontece nos dias dias 25 e 26 de novembro, no Teatro do Oprimido, na Avenida mem de Sá, Lapa, área central da cidade.

A oficina é direcionada a atores iniciantes ou veteranos, mas Joana revela que não é raro ter a participação de não atores, já que as técnicas se propõem a descobrir a originalidade e excentricidade de cada pessoa e, por isso, a oficina é compreendida como uma preparação para o indivíduo se conhecer e se fortalecer.

O trabalho consiste de quatro etapas a fim de promover uma investigação para se chegar aos que ela chama de mergulho no corpo e descobrir os vetores de improviso do personagem: dois campos receptivos, o ‘sobre’ e o ‘com’; e os ativos, o ‘por’ e ‘contra’.

A Carpintaria promove uma investigação para se chegar aos que ela chama de ‘mergulho no corpo’ a fim de descobrir os vetores de improviso do personagem: dois campos receptivos, o ‘sobre’ e o ‘com’; e os ativos, o ‘por’ e ‘contra’.

A atriz

Joana acumula no currículo participação em produções na TV entre novelas, séries, minisséries e participações especiais, somando atuação na TV Globo, Band TV, Record TV e na extinta TV Manchete, além de peças de teatro, filmes e também produções fora do Brasil.

Atualmente no ar com a reprise de ‘Mulheres Apaixonadas’, novela de Manoel Carlos exibida pela primeira vez, em 2003, no horário nobre da Globo. Na trama, ela dá vida a Eleonora Duarte, mãe solo de Fred, personagem de Pedro Furtado, que se encanta pela professora Raquel, vivida por Helena Ranaldi.

Seu mais novo trabalho é em ‘Fim de Semana no Paraíso Selvagem’, longa-metragem dirigido pelo cineasta Severino, anteriormente conhecido como Pedro Severien, que teve sua estreia na 46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro de 2022, onde ela interpreta a médica Maristela.

Ator, um agente social

Joana destaca o poder do teatro para a transformação do indivíduo e da sociedade. Atriz de cinema, teatro e novela, ela encontrou na contação de histórias uma forma de levar arte e conhecimento a pessoas em situação de vulnerabilidade social e emocional, como em presídios e comunidades carentes. A atriz revela que nesses ambientes a contação é mais impactante do que o próprio teatro, já que permite uma interação e um processo de troca de aprendizagem de vida.

“Na contação de história, o princípio do trabalho é com a essência do ser humano. Ela é não egóica, ela não é decorada, como no teatro, que tem o ator e o espectador. Ela é aprendida, é viva. É olho no olho e por isso toca mais o outro do que a apresentação de uma peça”, diz a atriz, revelando que se encantou pela abordagem da contação após muitos anos de dedicação ao teatro.

Para Joana, o autor deve se permitir viver situações reais e conhecer na pele as dificuldades e situações corriqueiras que as pessoas comuns enfrentam no dia a dia. Uma interação, segundo ela, que ajuda o ator na construção de novos personagens e proporciona uma troca mais humana.

Etarismo e mercado de trabalho 

Nem todo mundo se rende ao botox e aos encantos da harmonização facial, seguindo um caminho contrário ao que, atualmente, o trabalho com imagem vem exigindo. Joana reconhece a dificuldade de atores veteranos em conseguir papéis por conta da idade e lamenta que seja quase uma regra aqui no Brasil. Ela destaca que no cinema inglês, por exemplo, mulheres maduras têm a sua sensualidade reconhecida.

Otimista, a atriz espera que haja uma ‘mudança de chave’ e que pessoas de aparência madura tenham seu espaço.

“Eu to tendo que bancar isso [de ter a aparência da idade]. Eu quero que o meu envelhecimento seja sustentado pela arte. No cinema americano não há necessidade de ser jovem pra ser sensual”, observou ela.

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*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.