Com a Talcha, Mariana Schvartsman abre caminho para o chá premium no país

Negócio criado por mãe e filha mostra espaço para a bebida em um país dominado pelo café

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Mariana Schvartsman, fundadora da Talchá, aposta em expandir a cultura do chá no Brasil Foto: Divulgação

O café sempre reinou soberano no Brasil, mas há 15 anos uma dupla de empreendedoras decidiu desafiar essa tradição. Mariana Schvartsman e sua mãe, Mônica, transformaram o hábito familiar de tomar chá em casa em um negócio. A Talchá trouxe para o país blends autorais, chás raros e acessórios de preparo que até então só eram encontrados em viagens internacionais.

“Foi em uma viagem que Mônica teve uma experiência transformadora em uma loja de chás francesa. A partir daí decidimos mergulhar nesse universo”, lembra Mariana, que na época ainda cursava economia. O encantamento com os aromas e a descoberta de que o chá, assim como o vinho, tem terroir (termo francês que se refere à combinação única de características naturais) e identidade própria, serviram de base para o modelo de negócio.

O ritual noturno de beber chá das fundadoras se tornou o ponto de partida para pesquisas, testes de blends e a criação de uma carta que hoje reúne mais de 80 combinações. A missão, no início, foi desmistificar a bebida: “Muitos viam o chá como algo medicinal, quase um remédio. Queríamos mostrar que é saboroso, aromático e prazeroso, e que os benefícios vêm como consequência”, explica Mariana.

As infusões iniciais ajudaram a ampliar a base de clientes e continuam entre as mais pedidas desde a inauguração. Paralelamente, a marca passou a importar chás premium como Silver Needle, Gyokuro e Pérolas de Jasmim, destinados a um público conhecedor e exigente.

Mesmo sendo a 6ª população do mundo, o Brasil ainda é pequeno no mercado de chás, o que, para analistas, significa baixo grau de maturidade e, portanto, oportunidade de crescimento acelerado nos próximos anos. Em paralelo, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC), 2025 marcou uma desaceleração de consumo de café entre os brasileiros: 24% dizem ter reduzido o consumo, ante 3% em 2023, sobretudo por conta do preço elevado, o que sugere um consumidor mais disposto a experimentar outras bebidas quentes e frias.

Globalmente, o chá segue entre as bebidas mais consumidas, atrás apenas de água, com base em dados setoriais amplamente referenciados. Nos EUA, por exemplo, em um dia típico mais de 159 milhões de pessoas bebem chá; em 2021 foram 85 bilhões de porções de predominância de preto (84%) e verde (15%). Os dados são do United States Census Bureau.

Experiência, canais e B2B

A Talchá combinou loja física em São Paulo com e-commerce nacional, alavancado na pandemia, e avançou no B2B com presença em cafés, restaurantes, hotéis e spas, gerando “experimentação e fidelização”, segundo Mariana. Agora, a marca prepara um novo ciclo: “A partir de 2026 iniciaremos o projeto de franquias e esperamos estar presentes em diversas capitais do país dentro de dois a três anos”, afirma.

No portfólio, além dos chás de origem, as infusões continuam sendo porta de entrada do público e a nova linha em lata busca capturar a familiaridade do consumidor brasileiro com bebidas prontas: “Queremos que esse formato chegue aos mercados e às casas de todo o país.”

Para sustentar a recorrência, a Talchá aposta em narrativa gastronômica e didática: degustações, preparo correto e comparação entre estilos e procedências. “Observamos maior curiosidade em conhecer mais sobre o chá, sua origem, o processamento e as diferenças entre tipos”, afirma Mariana. Esse movimento acompanha o que já aconteceu com azeite, café e chocolate, quando o consumidor passou a valorizar terroir, método de preparo e rituais de degustação.

No entanto, lidar com chá também significa enfrentar as oscilações de uma commodity global. Clima, logística e barreiras fitossanitárias afetam diretamente oferta e preço. Em regiões produtoras, como Assam, na Índia, choques climáticos recentes impactaram a colheita e pressionaram o varejo internacional. Para uma empresa que trabalha com chás finos e blends autorais, como a Talchá, cada variação exige curadoria cuidadosa, renegociação com fornecedores e atenção constante à consistência sensorial. “A confiança do cliente depende de mantermos padrão de qualidade, mesmo quando o cenário externo muda”, pontua Mariana.

Na gestão, o modelo familiar também trouxe aprendizados. A transição de mãe e filha para sócias exigiu estabelecer limites e preservar espaços pessoais, evitando que o trabalho ocupasse todo o convívio doméstico. “É preciso adaptação para não levar o trabalho para todos os lugares e preservar os espaços familiares”, resume. Ao mesmo tempo, essa parceria garantiu visão estratégica de longo prazo, com decisões ancoradas em confiança mútua.

Agora, com o projeto de franquias previsto para 2026 e a linha de chás gaseificados em lata em expansão, a Talchá busca transformar curiosidade em hábito. Como define Mariana, o desafio é simples e ambicioso: ampliar o repertório do brasileiro para além do cafezinho e consolidar o chá como experiência de prazer, quente, gelado, em lata ou na xícara.