À frente da Gente, agência de marketing de influência formada exclusivamente por mulheres, Lídia Souza comanda um time de dez profissionais que já assinou campanhas para marcas como Nivea, Itaipava e Globoplay. Em cinco anos de operação, a empresa se destacou ao adotar um modelo sem casting fixo, fazendo curadoria personalizada de influenciadores para cada projeto, unindo análise de dados e olhar humano para entregar ações sob medida.
Mineira de Juiz de Fora, Lídia Souza passou 15 anos na cidade natal antes de se mudar com a família para o Rio de Janeiro. Criada em um ambiente conservador, sonhava em ser atriz e chegou a fazer cursos de teatro, mas acabou cedendo à pressão familiar para cursar Direito. “Fui por eliminação, para agradar meu pai. Mas sempre quis ser boa no que eu fizesse, então entrei de cabeça”, conta.
Formada, iniciou a carreira em um escritório composto apenas por homens. Era a única mulher na equipe e percebeu, logo cedo, o tratamento desigual. “Eu fazia mais do que todo mundo, mas era um pouco esnobada por ser mulher. Quando pedi aumento, ouvi que meu diferencial era apenas fazer o ‘feijão com arroz’ mais rápido.” A insatisfação virou impulso: buscou um mestrado em Portugal, emendou o doutorado e publicou um livro de processo civil.
Foi no meio da pandemia, com fronteiras fechadas e o doutorado interrompido, que surgiu o convite de um amigos do setor de eventos para liderar um projeto no marketing de influência, área na qual não tinha experiência. “No começo, eu entrava nas reuniões sem entender nada das nomenclaturas. Saía, pesquisava e voltava no dia seguinte sabendo do que se tratava”, lembra.
A criação da Gente
O desafio se transformou em oportunidade de negócio. Com toda a experiência adquirida por Lídia no segmento de marketing de influência, a profissional decidiu que sua própria agência nasceria com um diferencial: seria operada exclusivamente por mulheres.
“Estava cansada de sentar à mesa só com homens. Então, a Gente já nasceu como uma agência formada e operada só por mulheres. Os sócios homens não participam da operação, o dia a dia é todo nosso”, explica.
Cinco anos depois, a Gente mantém uma proposta distinta no mercado: não ter um casting fixo de influenciadores. A cada campanha, a curadoria é feita sob medida, cruzando dados de engajamento e alcance com análise humana. “No início, mapeávamos tudo manualmente. Hoje usamos tecnologia, mas o fator humano é indispensável”, diz. Essa escolha permite trabalhar com nomes diferentes para cada ação e evita o conflito de tentar encaixar talentos de um casting em campanhas para as quais não se encaixam.
Representação e desenvolvimento feminino
Mais do que executar campanhas, Lídia vê a agência como um espaço de formação e desenvolvimento. “Me enche os olhos desenvolver mulheres, muitas no primeiro emprego, e ver a transformação delas.” A rotina inclui ensinar habilidades técnicas, orientar sobre o mercado e incentivar a autonomia. Algumas ex-funcionárias abriram suas próprias agências. “A gente pode sentar à mesa com todos os homens e ser ouvida não por sermos bonitas, mas pela nossa inteligência e bagagem. Somos pequenas, mas somos grandes.”
O ambiente, segundo Lídia, combina profissionalismo e acolhimento. “Trabalhar só com mulheres exige cuidado, inteligência emocional e a capacidade de transformar vulnerabilidade em força. Não romantizo o empreendedorismo e nosso segmento: é um mercado novo, mas sério”, afirma.
Desafios do mercado e futuro
Lídia viu de perto a rápida profissionalização do marketing de influência, mas aponta que ainda há instabilidade e ausência de parâmetros claros. “Tem influenciador que cobra R$ 80 mil e outro R$ 5 mil pelo mesmo trabalho. Falta um código de ética que balize isso.”
A executiva também enxerga dilemas éticos no uso da inteligência artificial. “Na minha visão, ela é excelente para análise de dados, mas nada substitui o olhar criativo humano. E o consumidor precisa saber quando um conteúdo foi feito com IA”, defende.
Com a Gente, Lídia aposta em um crescimento sustentável, mantendo o propósito que motivou sua criação: abrir espaço para mulheres no mercado e oferecer campanhas pensadas caso a caso. “A tecnologia e as tendências mudam rápido, mas o nosso diferencial vai continuar sendo a humanização. No fim, é isso que constrói relações duradouras com clientes, influenciadores e com o nosso próprio time”, afirma.