Você já parou para pensar o que acontece conosco quando estamos ansiosos? Em momentos de grande ansiedade enviamos uma mensagem para o sistema nervoso que é ativada via conexões neurais e, nesse instante, ocorrem reações fisiológicas, emocionais e comportamentais. Doses de noradrenalina, dopamina, serotonina e cortisol são liberadas de acordo com nosso estado emocional – algumas pessoas ficam paralisadas, outras lutam ou fogem, e o corpo volta ao normal.
Se a ansiedade acontece com muita frequência, entramos em círculo estressor e podemos desenvolver ansiedade crônica, que aciona descargas maiores de hormônios, prejudicando o nosso bem-estar e, consequentemente, desencadeando doenças.
Por isso é essencial você aprender a lidar com a ansiedade, saber ser resiliente e tornar-se mais saudável. Deixe de acreditar apenas no lado ruim das situações estressoras, evitando o excesso que pode levar à diminuição da homeostase e, dessa forma, ativar os mecanismos que fazem fluidos, temperatura e pressão arterial reduzirem a atividade. Se deixar que o excesso tome conta de você, seu organismo se desequilibra.
Podemos entender que a natureza é sempre muito adaptável, maleável. Quando passamos a viver estados de ansiedade com muita frequência, algo em nós percebe que aquela condição não vai passar e, assim, aceitamos a ansiedade crônica como normal. Esse é o momento em que o adoecimento começa a acontecer. O importante não é tentar conter o fenômeno da ansiedade, mas ter mecanismos que nos permitam gerenciá-la regularmente.
A prática de ioga, respiração e meditação, entre outras, podem nos ajudar a viver bem, mesmo diante de fatores estressores, pois o autoconhecimento nos faz aprender a operar em uma frequência de equilíbrio e a se desvencilhar da crença comum de que o ser humano não se desenvolve melhor ao vivenciar a ansiedade.
Se fosse assim, nossa jornada seria insustentável. Não é, e não precisa ser. Aprender novas formas de viver bem é uma possibilidade real. Ser resiliente, para então vencer a ansiedade.
Os danos causados pela ansiedade são muitos e você precisa considerar o perigo que essa inimiga da sociedade moderna provoca na sua vida.
Os pesquisadores italianos Laura Musazzi, Paolo Tornese, Nathalie Sala e Maurizio Popoli relataram em um artigo científico que boa parte dos transtornos neuropsiquiátricos, como depressão, humor e estresse estão relacionados à ansiedade. De acordo com eles, cada indivíduo responde de maneira diferente às pressões da vida e a ansiedade. Quanto mais exposição a situações estressantes fortes ou repetidas, maior é a dificuldade de reagir. Nestes casos, além de doenças mentais, é possível surgirem as cardiovasculares e as metabólicas.
Os cientistas descreveram ainda que basta uma única exposição a estressores traumáticos para desencadear um transtorno neuropsiquiátrico. Como exemplo, citaram os moradores de L’Aquila, na Itália, que em abril de 2009 viveram o terror de um terremoto de magnitude 6,3 na escala Richter.
O tremor foi tão forte que destruiu casas e edifícios, provocando a morte de 309 pessoas e ferindo outras 1600. Dez meses depois, 900 sobreviventes participaram de um estudo para identificar estresse e ansiedade pós-traumática, e os resultados mostraram que 41,3% relataram sintomas desses transtornos que foram frequentes e debilitantes. Normalmente, eles estão relacionados a um estresse profundo provocado por um incidente súbito, como o terremoto que atingiu a cidade italiana.
As diferentes reações ao estresse e a ansiedade intrigam os pesquisadores, sobretudo para entender as respostas resilientes versus vulneráveis. A resiliência, que depende da genética e de fatores ambientais, é um processo ativo que ocorre por conta da neuroplasticidade cerebral, que permite alcançar um novo equilíbrio do meio ambiente. Ou seja, exercemos resiliência quando nos adaptamos à mudança.
A vulnerabilidade também tem fundo genético e se origina em eventos adversos anteriores da vida, que por meio de mudanças epigenéticas podem alterar a forma da resposta futura ao estresse e a ansiedade.
Um outro grupo de pesquisadores revisou diversos estudos científicos para entender como funcionam os mecanismos neurais de resiliência e vulnerabilidade ao estresse e ansiedade, e como são estabelecidos em níveis comportamental, celular e molecular. Afinal, cada um de nós reage de maneira diferente a eventos estressantes e outros podem desenvolver sequelas por um longo período.
Tamara B. Franklin, Bechara J. Saab e Isabelle M. Mansuy concordam que alguns indivíduos não conseguem se adaptar aos agentes estressores e dão respostas inadequadas que prejudicam a restauração, tornando o estado deles persistentes. Estes têm níveis de vulnerabilidade maiores e não se adaptam bem às situações adversas.
Já os resilientes percebem a adversidade como uma ameaça e logo desenvolvem respostas fisiológicas e psicológicas para se adaptar a ela, inclusive a longo prazo. Eles explicam que o estilo de enfrentamento varia entre indivíduos e situações, além de influenciar os sistemas neuroendócrino e neuroimunológico, ativados como resposta ao estresse.
Na revisão, os cientistas explicam que a conectividade anatômica e funcional do cérebro determina o grau de resiliência ou vulnerabilidade que o indivíduo lida com o estresse e a ansiedade.
O sistema neuroendócrino está fortemente relacionado à reação de cada pessoa, pois tem funções variáveis que alternam essas respostas. Isso porque o eixo HPA (hipotálamo, pituitária e adrenal) regula muitos sistemas do corpo, como o metabólico, cardiovascular, imunológico, reprodutivo e nervoso central. A atividade diferencial do eixo HPA, apontada pelos pesquisadores, está relacionada a um viés de resposta ao estresse: vários distúrbios são mais prevalentes em mulheres do que em homens.
A análise dos especialistas aponta que 31% das mulheres desenvolvem TEPT, nos homens, o índice é de apenas 19%. Foi considerado para o estudo um grande trauma em pessoas que vivenciaram estressores similares ao longo da vida.
Ao longo da revisão, os pesquisadores passam por inúmeros sistemas e áreas do cérebro que são afetados ou modulados pelos hormônios do estresse, mas chamou a minha atenção quando discorrem sobre mecanismos epigenéticos na resiliência e vulnerabilidade ao estresse.
Segundo eles, além de mecanismos e vias neurais específicos que modulam a atividade, a neurotransmissão e a sinalização do HPA, a resiliência e vulnerabilidade envolvem processos no nível da cromatina – fita dupla de DNA e proteínas histonas – e fatores genéticos e epigenéticos que, juntos, controlam a expressão de genes fundamentais para a regulação do estresse.
Ao se debruçarem sobre décadas de pesquisas em genética humana, constataram que doenças cerebrais complexas dependem da combinação de fatores genéticos e ambientais. Nesse emaranhado de conhecimento, fatores de risco para vulnerabilidade ou resiliência ao estresse foram identificados, mas os mecanismos epigenéticos, dizem eles, agora também são reconhecidos como fortes candidatos para interações gene-ambiente que afetam a resposta ao estresse e à ansiedade.
É importante ressaltar que a epigenética é o conjunto de processos que induzem mudanças hereditárias mitótica ou meioticamente na expressão gênica sem alterar a própria sequência de DNA, conforme descrevem os cientistas. Eles esclarecem que os mecanismos epigenéticos ocorrem principalmente na cromatina e envolvem vários mecanismos extremamente técnicos, como DNA metilação, modificações pós-traducionais covalentes de histonas (HPTMs), entre outros.
O que se sabe é que esses mecanismos podem agir tanto individualmente como em sinergia com outros para modular a estrutura da cromatina e são muito dinâmicos, podendo ser influenciados por fatores ambientais, como dieta, ambientes sociais e estresse. Sua desregulação tem sido associada a distúrbios do neurodesenvolvimento e psicopatológicos relacionados ao estresse. Para eles, ainda há muito a se desvendar sobre como as mudanças epigenéticas são desencadeadas, mantidas no cérebro e nos gametas, e se elas podem ser revertidas para atenuar os efeitos do estresse. Porém, há um bom indicador de que isso seja possível.
Fato é que as variadas respostas dos indivíduos ao estresse devem-se a fatores genéticos e ambientais complexos e, por vezes, causas indeterminadas que interagem e provocam essas particularidades.
Na revisão, notou-se que os mecanismos que estabelecem a resiliência ou a vulnerabilidade provavelmente atuam ao longo da vida, mas podem operar de forma diferente e afetar vias neurais distintas em variados estágios de desenvolvimento e na idade adulta.
Saber lidar com a ansiedade e o estresse é essencial para mitigar os seus efeitos sobre a saúde. Fugir não vai adiantar, pois eles fazem parte do dia a dia da sociedade moderna, então recomendo que você aprenda a gerenciar o impacto que eles podem ter no seu cérebro, via sistema nervoso, para barrar a ativação de processos inflamatórios e de doenças.
Para mitigar tais efeitos, recomendo as terapias integrativas, pois são práticas que nos ajudam a manter a homeostase e a harmonia física e mental. Sim, reduzir estados emocionais negativos ajuda a minimizar os efeitos da ansiedade sobre a saúde.
Gosto de recomendar o hábito de tomar banhos frios para meus pacientes. Apesar do desconforto nos primeiros dias, com o passar do tempo, o corpo se acostuma. Do ponto de vista neuroplástico, isso acontece porque o cérebro passar a reconhecer o banho frio como algo bom.
Situações estressantes, grandes e pequenas, fazem parte da nossa rotina, precisamos aprender a ser mais resilientes para acalmar a resposta do corpo a essas pressões. Importante lembrar que pequenos estressores também devem ser considerados, pois o acúmulo deles é tão prejudicial como grandes traumas.
Todos nós somos capazes de lidar com grandes demandas, mas precisamos saber como barrar o efeito da ansiedade e do estresse. Alguns estudos têm reconhecido o valor efetivo de práticas como meditação, respiração, yoga, entre outras, como recursos para aliviar as tensões. Isso porque essas práticas são terapias que integram corpo e mente, melhorando as sinapses cerebrais que ajudam a regular todo o organismo.
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.
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