A coisa mais surpreendente que pode acontecer é sonhar com um ser que se forma dentro de você, e imaginar como será seu cabelo, sua pele… e neste caso foi minha filha, a própria, quem apareceu no sonho quando eu estava grávida, dando um aviso claro de como deveria ser chamada: Any Gabrielly. Exatamente assim, sem alterar nada, nenhuma letra sequer.
Sim, sempre soube do talento dela, até mesmo antes do seu nascimento. Fiquei imaginando como trilhar o caminho certo para todo o brilho que estava convicta de que iria surgir, desabrochar – até a menina que vi em meus sonhos se tornasse o que é, uma estrela. Hoje Any é tudo aquilo, mais ainda, uma artista que vem se consagrando no cenário internacional, e desde a adolescência! Quem poderia apostar nisso? Uma mãe, talvez.
De repente ali estava eu, uma jovem de família pouco estruturada, mãe solo, tendo que iniciar tudo do zero. Poucas oportunidades para crescer, sem estudo, sem cultura, vivendo em área periférica de São Paulo, com histórico de enchente a cada chuva… sempre muito difícil, mas nada me fazia desistir.
A minha força, fome de conhecimento e vontade de construir um futuro melhor para nós, especialmente para a Any, só aumentavam – mesmo quando a realidade vinha à tona, e me colocava no chão, procurava fazer dele um alicerce para me transformar em porto seguro.
Começaram minhas batalhas silenciosas, chorando no banheiro pra ninguém ver, durante a primeira infância de Any. Foram os anos mais desafiadores da minha vida. Como eu iria protegê-la, dar tudo que ela precisava, em meio a tantas dificuldades?
Foi quando me veio o insight. Percebi que estava amadurecendo e precisava me fortalecer para lutar pelos nossos objetivos, lutar pelo que eu acreditava, pelo sucesso da Any – e para tanto, desde o início, era essencial lhe proporcionar a melhor educação possível, os colégios mais conceituados para lhe dar uma formação sólida em várias áreas.
Decidi que ela cursaria uma boa escola e percebi o quanto era caro. Também me determinei a fazer sua matrícula no balé, natação, inglês… tantas atividades! E só vinha a assombrosa matemática financeira em minha mente – não seria fácil mas não esperava mesmo que fosse.
Um dos maiores choques de realidade foi viver o racismo através dela. Nossa! Como me doía… Vários episódios que só demonstravam como, mesmo nas melhores escolas, o preconceito racial atinge adultos e crianças de forma brutal, aqui no Brasil.
Quando a Any teve um problema respiratório grave que a levou à internação, outro baque. Cheguei a ouvir do médico que ela nunca poderia fazer esforço físico. Fiquei em estado de alerta máximo: como ela continuaria todas as aulas de que tanto gostava e que seriam essenciais para ela no futuro, como a dança e o canto?
De verdade, qualquer um desistiria de tudo e tentaria um caminho mais fácil e tranquilo, quem sabe até mudaria de rota, alteraria os planos. E todos os conselhos e palpites seguiam sempre nessa direção:
“Para de sonhar tão alto. Você parece uma menina mimada que não percebe os golpes que a vida dá. Você é doida. Prefere andar de ônibus e pagar colégio caro? Para que essa menina precisa estudar inglês? Quem dança não tem nada na vida.”
Era difícil ouvir todas essas coisas – muito mais difícil seria ter que abandonar nossos sonhos! A vontade de desistir nunca andava do meu lado e nunca foi uma opção. A cada conquista, era lindo ver a estrela dela brilhar mais e mais. Aos 4 anos de idade aprendeu a ler e aos 5, já escrevia. Quando cantava era como um passarinho e ao dançar era um cisne. Dedicada e pioneira em tudo que fazia.
Incrível como tudo tinha um efeito reverso e, ao invés de me fazer desistir, só me estimulava cada vez mais e mais. Voltei a estudar, fiz milhares de cursos e trabalhei em três empregos simultaneamente. Meu Deus! Eu chegava exausta e ainda tinha mais trabalho, se fosse época de chuva então… Não sei de onde eu tirava tanta força. Aliás, sei sim. Do meu amor pela Any.
Ela entrou no coral Palavra Cantada, escola de bailado de São Paulo e, quando as coisas pareciam estar se encaixando… Surpresa! Veio a segunda gravidez. Não foi planejada mas eu aceitei tão bem, e hoje sou tão feliz porque tenho meu bebezão, a Belinha, que me enche de orgulho, assim como a Any.
Hoje sou mãe de duas meninas lindas, empresária, aprendi inglês, espanhol, estou estudando italiano… amo aprender novos idiomas, assimilar novas culturas, viajar por tantos lugares – e foi a Any que acabou me permitindo isso!
Depois de ter aulas com sua tia, ela conseguiu entrar para o “Teen Broadway”, escola de teatro musical. Aos 11 anos foi escolhida para interpretar Nala, no clássico “O Rei Leão”, aos 12 participou do coral no musical “O menino maluquinho”, de Ziraldo, logo depois cantava e surpreendia a todos apresentando o espetáculo “Broadway in Concert”, da Orquestra Filarmônica de Curitiba. Foi um sucesso no famoso grupo pop “Now United”, que reúne jovens de inúmeros países, quando despontou para a carreira internacional.
Hoje a menina que avisou quem iria ser, já é: cantora, dançarina, dubladora, apresentadora e influencer com mais de 7 milhões de seguidores no Instagram. Aos 20 anos ela trilha uma carreira impressionante e eu, aos 41, mãe ativa e sonhadora – tenho muita coisa pra contar. E não vejo a hora de dividir tudo isso com vocês.