Cólicas menstruais são velhas conhecidas para 95% das mulheres. Para algumas, no entanto, essa dor é bem maior que um desconforto capaz de ser atenuado por um analgésico, um antiinflamatório, ou uma bolsa de água quente. Enjoos, vômitos, tontura, dores que irradiam para a lombar, dores de cabeça…Uma combinação de agonias que dificultam qualquer atividade.
Pensando nelas, o Distrito Federal acaba de aprovar uma nova lei que permite que as servidoras públicas do estado fiquem de licença ao longo desses dias críticos. Esse tipo de iniciativa já existe em outros países como Espanha, Japão, Indonésia, Coreia do Sul e Zâmbia. Também em algumas empresas privadas no Brasil essa prática já foi adotada. E antes que se pense que isso levaria a uma diminuição na produtividade, na prática esse receio não se mostrou real.
Ainda há uma série de discussões envolvidas, já que o governador Ibaneis Rocha, do MDB, pretende recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar derrubar a lei. Mas, para além das questões práticas e jurídicas, é a primeira vez no Brasil que se reconhece em nível governamental o sofrimento pelo qual passam tantas mulheres, todos os meses. Levando em consideração o quanto esse sofrimento é historicamente minimizado, já há motivos para comemoração.
As cólicas menstruais geralmente aparecem próximas ao início do sangramento e podem durar cerca de dois a três dias. A causa exata não é completamente compreendida, mas parece estar relacionada às contrações uterinas intensas causadas pela liberação de prostaglandinas, substâncias químicas que desempenham um papel na dor e na inflamação. Quando a intensidade dos sintomas é tão intensa que impacta ou até mesmo impede a realização de tarefas cotidianas, a condição é chamada, não à toa, de dismenorréia incapacitante.
É importante deixar claro que esse tipo de desconforto, embora relativamente comum, não é “normal” e precisa ser investigado, já que pode estar ligado a outros fatores. O mais comum deles é a endometriose – de que tratei na minha última coluna – mas existem outros, como a adenomiose, miomas uterinos ou infecções pélvicas. Outras vezes, mesmo investigando, não se detecta um fator na gênese da dor, sendo chamada então de dismenorréia primária.
O descanso do trabalho é bem-vindo e importante para que a mulher possa se cuidar, mas existem recursos para minimizar a dismenorreia e devolver a essa mulher uma qualidade de vida para que, eventualmente, ela não precise mais recorrer à licença. Mais que isso: quando não tratado, o ciclo de dor altera os mecanismos de sensibilização do sistema nervoso central, levando a uma predisposição a dores crônicas, tanto na região pélvica como fora dela.
A terapia mais utilizada atualmente é o uso de DIUs hormonais. Por inibirem o processo ovulatório, eles acabam com as oscilações hormonais fisiológicas do ciclo. Além disso, esses métodos também diminuem consideravelmente o crescimento do endométrio, tecido que descama na menstruação e libera os mediadores inflamatórios que causam a dor. Também há estudos que mostram o benefício de medidas complementares, como a prática regular de exercícios, uma dieta balanceada e particularmente rica em ômega-3, a suplementação com vitamina D e acupuntura. Em cerca de um quarto das mulheres que sofrem de dismenorréia incapacitante será preciso recorrer a cirurgias.
A conclusão a que se chega uma vez mais é que, quando existe o acesso à informação e aos tratamentos disponíveis, nós mulheres podemos viver nossas vidas profissionais plenamente, convivendo em paz com os altos e baixos hormonais que nos fazem mulheres. Essa é a proteção que o Estado nos deve.
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