Marcenaria feita por mulheres: Titta Souza cria oficina artesanal e inclusiva em SP

Combinando técnicas e reaproveitamento de materiais, Titta planeja abrir cursos livres voltados ao público feminino e LGBTQIAPN+

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Titta Souza, fundadora da Azagaia, desenvolve peças autorais em madeira e ferro, unindo design, inclusão e reaproveitamento de materiais Foto: Divulgação

Combinando técnica, reaproveitamento de materiais e inclusão, Titta Souza transformou a paixão pela marcenaria em negócio e ferramenta de mudança social em São Paulo. Dona da Azagaia, uma oficina de marcenaria e serralheria, a profissional desenvolve peças autorais em madeira e ferro. Feita para ser um espaço de inclusão e aprendizado, a oficina emprega mulheres e pessoas do público LGBTQIAPN+. “É um ambiente para se produzir e, ao mesmo tempo, ocupar um setor que ainda é majoritariamente masculino”, afirma.

Fundada em 2019, a empresa leva o nome de uma lança de arremesso – objeto que simboliza técnica, precisão e resistência. Designer e diretora de arte, Titta coordena e acompanha todas as etapas de produção da Azagaia. É ela quem desenvolve as peças de acordo com o gosto e a necessidade de quem as encomenda, levando em consideração a funcionalidade e as características da matéria prima utilizada.

De móveis sob medida a itens decorativos, o catálogo da marcenaria é inteiramente personalizado. “Nossos projetos são feitos dentro da oficina, de maneira artesanal, com o apoio de profissionais que são contratadas conforme a demanda de cada obra”, explica.

O detalhe das peças chama atenção e atrai, principalmente, o interesse de mulheres. Segundo Titta, o público da Azagaia é maioria feminino. “Nosso diferencial está no processo de criação conjunta. Quando a cliente ainda não tem nada desenhado, a gente constrói tudo juntas, com troca de ideias e muita escuta”, diz.

Entre os trabalhos de maior destaque, estão os suportes de segurança para obras de arte desenvolvidos especialmente para o Museu de Arte de São Paulo, o MASP. Produzidos pela Azagaia, os apoios estão em exibição na mostra ‘Artes da África’, em cartaz até 3 de agosto no Edifício Pietro Maria Bardi, o novo prédio do museu.

A parceria entre a Azagaia e o MASP já dura três anos, período em que a marcenaria vem prestando serviços especializados para a instituição. Nesse tempo, foram desenvolvidos e executados diversos projetos sob medida, com foco em segurança, funcionalidade e preservação das obras expostas. “É um marco muito importante para mim, não apenas como profissional, mas é uma realização de vida”, conta.

Ideias para cursos livres

Outro plano de Titta com a oficina é compartilhar conhecimento, ensinando técnicas de marcenaria e serralheria a outras mulheres e pessoas do público LGBTQIAPN+. A ideia é que o espaço também funcione como um lugar seguro para errar, aprender e criar.

Titta conta que participou, no ano passado, de uma formação para professores promovida pelo coletivo itinerante Xilomóvel. “Quero estimular outras pessoas a descobrir o seu lado criativo, colocar a mão na massa e se reconhecer nas próprias criações”, revela.

Recentemente, a Azagaia ofereceu um curso livre, prático e de curta duração, em parceria com a instituição Leo Social. Os participantes estiveram na oficina para participar do curso de espátula. “Produzimos a peça juntos, e eles puderam levar a ferramenta para casa”, conta.

Durante a atividade, o grupo acessou os equipamentos de segurança e conheceu os maquinários e as ferramentas manuais mais simples da marcenaria. “São itens do dia a dia, como lixadeira, lima ou serrote. Ferramentas que muita gente já tem.”

Mas o objetivo da designer é ampliar o acesso à oficina e consolidar um calendário fixo de cursos livres, ​​alcançando um número cada vez maior de participantes. “A proposta é desenvolver práticas que possam ser reproduzidas em casa ou em espaços menores, com baixo custo, pouco barulho e menos poeira”, explica.

Todos os cursos serão estruturados para unir a parte técnica com uma abordagem mais lúdica. Porque para Titta, criar uma peça é também um gesto de afeto. “A marcenaria vai além da técnica, quando alguém faz algo com as próprias mãos, está colocando ali sua história, seu tempo e sua intenção”, afirma.

Responsabilidade ambiental

Além de priorizar a diversidade entre os profissionais que integram a equipe por projeto, o respeito ao meio ambiente também é um dos valores praticados por Titta. Desde 2020, a Azagaia mantém um estoque de madeira do tipo peroba, “a vontade surgiu depois que percebi o descarte frequente desse material nas ruas.”

A designer explica que grande parte da madeira usada na região Sudeste do Brasil vem da Amazônia. E mesmo as madeiras certificadas, que são extraídas de áreas com manejo florestal autorizado, sustentável e sob controle de impacto ambiental, ainda podem ser preservadas.

“O processo de gentrificação em São Paulo, ou seja, a demolição de casas antigas para a construção de grandes prédios me fizeram perceber a grande oferta de matérias primas destacadas”, diz.
Titta encontrou diversas madeiras deixadas em caçambas. “A oficina e a minha casa estavam localizadas em regiões de construção, então, todo santo dia, eu encontrava uma madeira de peroba”, detalha.

Com as madeiras do estoque, além de fazer as encomendas da Azagaia, a diretora de arte montou uma série de penduricalhos feitos com batentes de peroba. “O mais legal é que cada peça tem a sua própria identidade, porque eu mantenho as marcas e formas originais da madeira”, conta.