Mesmo com supersalários, 80% das mulheres que atuam em MPs enfrentam desigualdade

Levantamento da Plataforma Justa aponta que a maioria das promotoras e procuradoras atua em órgãos onde homens seguem recebendo mais, mesmo quando exercem as mesmas funções

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Embora recebam menos que os homens, mulheres de 15 dos 21 MPs estaduais analisados tiveram rendimentos médios mensais acima do teto constitucional Foto: Envato

Um estudo da Plataforma Justa publicado na quarta-feira, 17, revela que, mesmo em carreiras marcadas por supersalários, a desigualdade de gênero ainda persiste. Segundo a pesquisa, 80% das promotoras e procuradoras de Justiça em atividade no país trabalham em MPs (Ministérios Públicos) que pagam menos às mulheres do que aos homens que ocupam os mesmos cargos.

O levantamento mostra que a disparidade não é pontual e atravessa praticamente todo o sistema, atingindo tanto os MPs estaduais quanto o MPF (Ministério Público Federal), se mantendo mesmo nas posições de maior remuneração.

Para chegar aos resultados, a Plataforma analisou a média anual do rendimento líquido pago aos membros ativos dos MPs e do MPF ao longo de 2024. Embora recebam menos que os homens, mulheres de 15 dos 21 MPs estaduais analisados tiveram rendimentos médios mensais acima do teto constitucional, hoje fixado em R$46 mil.

No âmbito federal, o cenário se repete. Em 15 das 27 unidades da federação, os pagamentos médios no MPF também superaram o teto. Ainda assim, em média, cada procuradora recebeu R$4,4 mil líquidos a menos por ano do que um procurador no mesmo cargo. No MPF, um terço das mulheres teve rendimento médio anual inferior ao dos homens.

Mulheres são minoria no topo

Além da desigualdade salarial, a pesquisa revela um desequilíbrio na ocupação de cargos. No MPF, as mulheres representam apenas 30% da força de trabalho. Nos MPs estaduais, elas são 41%.

No topo da carreira federal, o cenário é ainda mais restrito. Em 134 anos de história do MPF, apenas uma mulher, Raquel Dodge, ocupou o cargo de procuradora-geral da República. Atualmente, as mulheres são 29% das procuradoras federais, 32% das procuradoras regionais da República e 29% das subprocuradoras-gerais.

Nos estados, apenas três Ministérios Públicos são chefiados por mulheres: Piauí, Santa Catarina e Amazonas. O Rio de Janeiro é a única exceção em termos de composição geral, com mulheres representando 57% da força de trabalho, um percentual superior ao da população feminina brasileira, estimada em 51,5% pelo IBGE.

Onde a diferença é maior

Em 13 dos 21 MPs estaduais analisados, mais da metade das mulheres é impactada por diferenças salariais. Em estados como Alagoas, Piauí e Paraíba, todas as promotoras e procuradoras tiveram média anual de rendimento líquido inferior à de homens nos mesmos cargos.

A desigualdade também varia conforme o cargo. Entre as promotoras estaduais, 61% receberam menos que os promotores. Entre as procuradoras, esse percentual caiu para 41%. A progressão na carreira, por esse viés, reduz a disparidade, mas não a elimina.

Em relação ao Ministério Público Federal, 34% das mulheres tiveram média anual de rendimento líquido inferior à dos homens no mesmo cargo, o que significa que uma em cada três procuradoras recebe menos que colegas homens exercendo as mesmas funções. 

Na média geral, cada procuradora federal recebeu R$4.496,16 a menos ao longo do ano. Ao analisar o recorte de cargo, procuradoras da República receberam, em média, R$ 5.290,46 a menos; procuradoras regionais, R$ 5.719,95 a menos; e subprocuradoras-gerais, R$ 335,28 a menos.

Metodologia da pesquisa

Dos 27 Ministérios Públicos estaduais, apenas 21 puderam ser analisados. Ceará, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Rondônia, Santa Catarina e Sergipe ficaram de fora por não disponibilizarem bases salariais estruturadas que permitissem a comparação.

Ao todo, foram examinados 113.112 registros de remuneração referentes a 2024. Também foram analisadas as listas de membros ativos publicadas nos Portais da Transparência, o que permitiu identificar 12.734 promotores e procuradores nos MPs estaduais e no MPF.