A história costuma ser contada como uma sucessão de grandes homens geniais, como se o progresso científico fosse uma linha reta construída por mentes masculinas. Fato é que, em mais de 120 anos de história, apenas 26 mulheres receberam o Nobel nas áreas de Física, Química e Medicina, representando apenas 3,9% dos laureados.
Mas basta se aproximar das margens para perceber que a ciência possui muitas mulheres que quase ninguém conhece. E, por mais que elas tenham mudado o rumo da humanidade, muitas tiveram suas descobertas apagadas, apropriadas, ignoradas ou assinadas por colegas homens. Conheça algumas delas:
Chien-Shiung Wu (1912-1997)

Foto: Acc. 90-105 – Science Service, Records, 1920s-1970s, Smithsonian Institution Archivess
Nos anos 1950, enquanto os Estados Unidos celebravam avanços nucleares, uma imigrante chinesa trabalhava no laboratório do Projeto Manhattan, responsável pelo desenvolvimento da bomba atômica. Chien-Shiung Wu mostrou que uma das “leis eternas” da física, o Princípio de Conservação da Paridade, era, na verdade, falha.
A descoberta foi revolucionária. Mas quem subiu ao palco do Nobel foram seus colegas teóricos, Chen Ning Yang e Tsung Dao Lee, não a mulher que realmente provou a hipótese, que nem ao menos foi mencionada.
Ida Tacke (1896-1978)

Foto: Reprodução/ Wikimedia Commons
A alemã Ida Tacke, com seus experimentos em química e física atômica, encontrou dois novos elementos da tabela periódica: o rênio (75), pelo qual foi devidamente creditada, e o masúrio (43). O segundo não foi aceito e seria, anos depois, recriado em laboratório e renomeado como tecnécio, sendo atribuído a dois cientistas, Carlo Perrier e Emilio Segre.
Tacke ainda antecipou processos fundamentais da fissão nuclear em um artigo que publicou. Suas previsões seriam mais tarde retomadas, validadas e premiadas 5 anos depois por Lise Meitner e Otto Stern.
Elisa Frota Pessoa (1921–2018)

Foto: Arquivo pessoal/ G1
Elisa Frota Pessoa foi uma das primeiras mulheres a se formar em física no Brasil e ajudou a fundar o CBPF (Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas), um dos pilares da ciência nacional. Especialista em radioatividade, coordenou o Laboratório de Emulsões Nucleares e fez parte das primeiras pesquisas brasileiras em física nuclear.
Esther Lederberg (1922-2006)

Foto: Reprodução/ Wikimedia Commons
Em Harvard, no início do século 20, mulheres trabalhavam como “computadoras” e ganhavam 30 centavos por hora para fazer cálculos que sustentavam o progresso astronômico da instituição.
Entre elas estava Henrietta Leavitt, que começou seu trabalho medindo e catalogando estrelas no Observatório de Harvard e foi responsável por enxergar a relação entre luminosidade e distância entre elas e a Terra, a chave que abriu o Universo para estudos avançados.
Rosalind Franklin (1920–1958)

Foto: Reprodução/ Wikimedia Commons
Rosalind Franklin revolucionou a biologia molecular ao capturar, em 1952, a imagem mais importante da história da genética: a Foto 51. A nitidez do registro permitiu decifrar a estrutura em dupla hélice do DNA, base de toda a vida conhecida.
Mas a fotografia foi mostrada sem sua autorização a Watson e Crick, que publicaram a descoberta e ganharam o Nobel de 1962. Rosalind morreu quatro anos antes, sem saber que sua contribuição havia sido fundamental para desvendar o código da vida.
Nettie Stevens (1861–1912)

Foto: Reprodução/ Wikimedia Commons
Nettie Stevens demonstrou que o sexo biológico não era determinado pelo ambiente, mas sim por cromossomos específicos: X e Y. Sua conclusão mudou toda a genética moderna. Mesmo assim, foi Thomas Hunt Morgan, seu colega mais famoso, quem recebeu o reconhecimento posterior com base nas descobertas de Nettie.
Jocelyn Bell Burnell (1943–)

Foto: Reprodução/ Wikimedia Commons
Em 1967, Jocelyn Bell Burnell identificou os primeiros pulsares, estrelas de nêutrons que emitem ondas regulares, descoberta que abriu um novo campo dentro da astrofísica. Porém, em 1974, o Nobel foi concedido ao seu orientador, Anthony Hewish, e ao radioastrônomo Martin Ryle. Jocelyn foi ignorada e, décadas depois, somente em 2018, ela recebeu prêmios tardios reconhecendo sua importância.
Sonia Guimarães (1957–)

Foto: Reprodução/ Wikimedia Commons
Sonia Guimarães tornou-se a primeira mulher negra doutora em física e professora do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) no Brasil, em uma época em que a instituição nem aceitava alunas mulheres, em 1993.
A cientista também se formou no mestrado em física aplicada na USP e continua sua atuação como ativista pela luta contra o racismo e discriminação de gênero na ciência.
Vera Rubin (1928–2016)

Foto: Reprodução/ Wikimedia Commons
Vera Rubin mediu a velocidade de rotação das galáxias e percebeu que havia muito mais massa no Universo do que aquilo que era visível, ao observar que as estrelas nas partes remotas das galáxias tinham uma velocidade orbital igual à das estrelas no centro da galáxia. Assim nasceu o conceito de “matéria escura”, um dos pilares da cosmologia moderna.
Mesmo com essa descoberta, Rubin nunca recebeu o Nobel e suas teorias só foram aceitas mais tarde após serem validadas por colegas homens.