Sátira inspirada no clássico Frankenstein, “Pobres Criaturas”, o filme que estreou ontem nos cinemas brasileiros como um dos favoritos ao Oscar, traz Emma Stone em seu esplendor. Na pele de Bella Baxter, experimento científico que supera expectativas do seu criador, a atriz encarna um grande enigma: e como seríamos nós, mulheres, livres de pressões e condicionamentos sociais? Por seu desempenho no longa, ela recebeu sua quarta indicação ao Oscar como melhor atriz.
Alegórico, extravagante, o épico dirigido pelo diretor Yorgos Lanthimos é um dos favoritos da temporada, concorrendo em 11 categorias no Oscar. Já arrebatou o Leão de Ouro no festival de Veneza, em setembro passado, quando o cineasta grego respondeu candidamente à pergunta sobre qual seria, afinal, a mensagem principal do filme:
“Só criamos condições para os personagens revelarem conflitos do comportamento humano”, afirmou ele, “e através da fábula, da fantasia, revelarmos alguns absurdos em nosso comportamento real”.
O longa foi baseado no livro “Poor Things”, de Alasdair Gray, lançado em 1992. Era um projeto antigo de Lanthimos, fervorosamente abraçado por Emma Stone, que também concorre ao Oscar como produtora do filme. A dupla já trabalhou junto em vários longas, como no perturbador “A favorita”, consagrado pela crítica em 2018 (atualmente disponível na Netflix).
“Pobres Criaturas”, na tradução em português, levou anos para ser roteirizado e produzido – até ser finalizado como um épico fantástico e suntuoso. Situado na Era Vitoriana, o filme conta a história da maior experiência do cientista e professor Godwin Baxter, interpretado por William Dafoe, que ressuscita uma grávida suicida transportando, para o lugar de seu cérebro, o do próprio feto.
O ser que renasce, Bella Baxter, tem corpo de mulher e mente de criança – mas de forma acelerada vai evoluir, surpreendendo tanto seu criador, a quem ela chama de “God”, como o assistente do cientista, que por Bella se apaixona perdidamente. A incomum criatura começa a olhar o mundo com inocência mas extrema curiosidade. Do que ela mais gosta? De sexo, naturalmente.
“Por que as pessoas não fazem isso o tempo inteiro?”, é o que Bella vai perguntar ao seu primeiro amante, Duncan Weddburn, vivido por Mark Rufallo.
A jornada de auto-descoberta de nossa protagonista é uma aventura sexual ardente. Desde os primeiros exercícios de masturbação às cavalgadas furiosas com Duncan, Bella se entrega ao prazer de forma arrebatadora. “O filme todo é uma metáfora”, como comentou Emma Stone no programa de Stephen Colbert, em janeiro passado:
“Foi o meu papel mais complexo e desafiador”, ela admitiu, para uma plateia fascinada. “De alguma forma a personagem sintetiza essa fantasia de sermos confiantes, livres dos condicionamentos, orientadas só pela intuição e desejo. Bella age como uma mulher reagiria no mundo, se não tivéssemos sido influenciadas pelas normas, costumes e expectativas masculinas”.
O filme-fantasia também poderia ser definido como um punk dramático, romântico e futurista, que nos conduz por um mundo artificial e espetacular – da Londres do início do século 19, o longa nos leva por uma viagem de circum-navegação que inclui Lisboa, Alexandria e Paris. As locações extravagantes, somadas a figurinos que tanto evocam a moda vitoriana como as cores e cortes dos anos 1960 e 1970, buscam exatamente expandir nossa compreensão sobre o mundo de Bella:
“Ela age de forma intuitiva e, naturalmente, surreal”, observou a protagonista, “mas essa é mais uma provocação do filme, que nos leva a refletir sobre absurdos que ainda podemos estar vivendo hoje”.
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