O ambiente escolar é, na grande maioria das vezes, o lugar onde a criança tem o primeiro contato com o racismo – esta é a conclusão de diversos estudos, como alguns já realizados por instituições como o Observatório da Branquitude, além de entrevistas publicadas pelo Instituto Alana. Tal realidade se torna ainda mais visível e palpável quando falamos de instituições com maioria de pessoas brancas, tanto alunos quanto corpo docente.
E nos questionamos: as escolas estão prontas para lidar com os casos de racismo, identificando, nomeando e tratando como o são, e não os equiparando a bullying ou, pior, “coisa de criança”? Infelizmente a resposta, na grande parte dos casos, ainda é negativa.
Vivemos em uma sociedade na qual admitir o racismo é algo pior que o ato racista em si. Uma sociedade erguida tendo por base a dominação de um povo por outro e que se fortalece na crença nutrida, todos os dias, de que brancos foram e ainda são superiores a negros. É o que chamamos de supremacia branca.
Dentro dos ambientes escolares, a manifestação do racismo decorre exatamente da reprodução de mundo e valores que crianças e adolescentes vivenciam em suas casas e locais onde frequentam.
O modelo da superioridade branca, ficando a pessoa negra relegada à ocupação de lugares de não protagonismo e subserviência, é o que direciona o entendimento de mundo e as ações perpetradas nesse sentido.
A grande questão que se impõe, portanto, é a seguinte: se o racismo se manifesta nos ambientes escolares, especialmente entre os alunos, como ele pode e deve ser ali também combatido e enfrentado de forma a transformar efetivamente realidades?
Infelizmente nem todos os casos de racismo acabam sendo identificados e notificados como tal. Alguns ficam escondidos pelo medo da criança ou adolescente vítima de sofrer algum tipo de retaliação social entre os colegas, ou mesmo das famílias, que optam por cuidar internamente das dores causadas pelas atitudes racistas, sem envolvimento da escola.
Dos casos levados ao conhecimento ou presenciado por professores e equipes das instituições de ensino, ainda temos uma grande quantidade sendo erroneamente nominada como bullying ou mesmo encarada como brincadeira e comportamento de criança.
Para muito além da atitude das famílias, quando assim o fazem, a exemplo da atriz Samara Felippo, quanto ao racismo sofrido por sua filha em ambiente escolar, é necessário que todo o corpo escolar esteja preparado para lidar efetivamente com tais situações.
Identificar, nominar, e tratar todos os envolvidos considerando que o que ali aconteceu foi um crime, assim definido pela legislação pátria.
Ainda nos deparamos com ausência de representatividade negra dentro das escolas, especialmente se estamos diante de instituições particulares que atendem classes sociais como média/média-alta/alta, o que apenas reforça o estigma vivido fora de sala de aula pelas crianças e adolescentes autores de comportamentos racistas.
Tal realidade acaba por potencializar a reprodução de atos racistas que decorrem justamente da crença em uma superioridade branca. E isso independe do recorte social. O caso da filha da atriz Samara Felippo vem confirmar que a cor de pele, não importa onde, sempre chega antes.
Eu, mãe branca de um menino negro, também vi o racismo encontrar meu filho primeiramente na escola. Situações diferentes, cidades diferentes, escolas diferentes, mas mesmo sentimento: impotência ao lado do desejo de mudar o mundo.
Exigir mudanças de atitude diante de situações como essa demanda que nos afastemos tanto quanto possível da emoção e sejamos racionais. É necessário mais que o grito inicial de indignação. É necessário letramento racial, até para estabelecer que a escola também faça o próprio dever de casa e entenda a gravidade da ocorrência de um ato racista.
Mudar essa realidade é uma tarefa de todos nós. Escola, pais e mães de crianças negras e especialmente pais e mães de crianças brancas.
Estamos prontos para abraçar nossa responsabilidade?
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.