Volta ao trabalho após o parto expõe lacunas no apoio à saúde mental das mães

Período traz mudanças hormonais, emocionais e físicas que tornam a volta ao trabalho um desafio silencioso para muitas mulheres

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Cerca de 50% dos casos de DPP não são diagnosticados Foto: Envato

Voltar ao trabalho depois do parto não é apenas trocar o pijama pela roupa do escritório. É enfrentar um turbilhão de emoções, expectativas e barreiras muitas vezes invisíveis, especialmente quando associado à DPP (depressão pós-parto). Para muitas mulheres, o retorno profissional é tão desafiador quanto a própria gestação, impactando a saúde mental, a autoestima e, consequentemente, o desempenho.

Segundo dados da Fiocruz de 2024, cerca de 25% das mães de recém-nascidos no Brasil são diagnosticadas com DPP, um quadro que se manifesta por tristeza profunda, insônia, alterações no apetite, falta de energia e sentimentos de culpa ou inutilidade. Estudos internacionais indicam que 10% a 15% das mulheres apresentam dificuldades em estabelecer vínculo com o bebê, o que intensifica o impacto emocional durante o retorno ao trabalho.

A psicóloga Larissa Fonseca, doutoranda da Unifesp e especialista em saúde materna, explica: “Muitas mulheres acham que a licença termina quando o bebê nasce. Mas o pós-parto é o início de uma reorganização física e emocional, e esse processo continua muito depois do retorno ao trabalho”. 

Fatores que agravam a depressão pós-parto

A DPP não surge isoladamente. A falta de apoio social, seja da família ou de uma rede comunitária, aumenta significativamente o risco de sintomas depressivos. Condições de trabalho pouco acolhedoras, como jornadas extensas, falta de reconhecimento e pressão constante, também podem intensificar o quadro.

“O estresse corporativo se soma à sobrecarga doméstica, criando um ciclo de culpa, cansaço e baixa autoestima. Muitas mulheres se sentem incapazes de dar conta de tudo, tanto no trabalho quanto em casa”, reforça Larissa.

Além disso, cerca de 50% dos casos de DPP não são diagnosticados devido a vergonha, falta de informação e pressão interna. O resultado é um ciclo de culpa, medo de falhar e sobrecarga, que pode levar ao afastamento temporário ou definitivo do mercado de trabalho, se não for diagnosticado e tratado de forma efetiva.

O papel das empresas 

Dados da Fundação Getúlio Vargas mostram que 48% das mulheres perdem o emprego até 12 meses após a licença-maternidade, evidenciando a falta de preparo para acolher mães nesse período de transição. Muitas ainda ignoram necessidades básicas, como pausas para amamentação, horários flexíveis ou acompanhamento psicológico.

“O retorno ao trabalho não pode ser visto apenas como um processo burocrático. Um ambiente acolhedor transforma a mãe em uma profissional mais madura, resiliente e organizada, beneficiando tanto a mulher quanto a empresa”, aponta.

As empresas têm um papel central na reintegração das mães ao mercado de trabalho. Ambientes flexíveis, programas de apoio psicológico e políticas adequadas de licença-maternidade podem facilitar a transição e reduzir riscos associados à depressão pós-parto. “Não existe um ponto final para a maternidade. Cada fase exige adaptações e, sem apoio, a mulher pode se sentir constantemente desestabilizada”.